Aricelma
sábado, 20 de julho de 2013
PROSTITUIÇÃO INFANTIL - Crônica de Olavo Bilac- Gazeta de Notícias 14/8/1894
Não sei
que jornal, há algum tempo, noticiou que a polícia ia tomar sob a sua proteção
as crianças que aí vivem, às dezenas, exploradas por meia dúzia de bandidos.
Quando li a notícia, rejubilei. Porque, há longo tempo, desde que comecei a
escrever, venho repisando este assunto, pedindo piedade para essas crianças e
cadeia para esses patifes.
Mas os
dias correram. As providências anunciadas não vieram. Parece que a piedade
policial não se estende às crianças, e que a cadeia não foi feita para dar
agasalho aos que prostituem corpos de sete a oito anos… E a cidade, à noite,
continua a encher-se de bandos de meninas, que vagam de teatro em teatro e de
hotel em hotel, vendendo flores e aprendendo a vender beijos.
Anteontem,
por horas mortas, [***] que me encheu de mágoa e de nojo, de indignação e de
angústia. Saía de um teatro. [***] rua central da cidade, deserta a essa hora
avançada da noite, vi sentada uma menina, a uma soleira de porta. Dormia. Ao
lado, a sua cesta de flores murchas estava atirada sobre a calçada.
Despertei-a.
A
pobrezinha levantou-se, com um grito. Teria oito anos, quando muito. Louros e
despenteados, emolduravam os seus cabelos um rosto desfeito, amarrotado de sono
e de choro. E dentro do miserável vestidinho de chita, todo o seu corpo tremia,
como numa convulsão, nervosamente. Quando viu que não lhe queria fazer mal, o
seu ar de medo mudou- se logo num ar de súplica. Pediu-me dez tostões,
chorando.
E a sua
meia-língua infantil, espanholada, disse-me coisas que ainda agora me doem
dentro do coração.
Perdera
toda a féria. Só conseguira obter, ao cabo de toda uma tarde de caminhadas e de
pena, esses dez tostões — perdidos ou furtados. E pelos seus olhos molhados
passava o terror das bordoadas que a esperavam em casa…
"Mas
é teu pai quem te esbordoa?"
"E
um homem que mora lá em casa…"
Dei-lhe
os dez tostões, sem poder falar.
Ela, já
alegre, com um sorriso divino que lhe iluminava a face úmida, pediu-me mais
duzentos reis — para si, esses, para doces.
Guardou
a nota na cesta, e meteu a mesada na meia, depressa, para a esconder…
Fiquei
parado, longo tempo, a olhá-la. O seu vulto fugia já, pequenino, quase
invisível na escuridão. Ainda de longe o vi, fracamente alumiado por um
lampião, sumir-se, dobrando uma esquina. Segui o meu caminho, com a morte na
alma.
Ora —
nestes tempos singulares em que a gente já se habituou a ouvir sem espanto
coisas capazes de horrorizar a alma de Deiber
—, é possível que alguém, encolhendo os ombros diante disto, me pergunte, o
que é que eu tenho com a vida das crianças que vendem flores e são amassadas a
sopapos quando não levam para casa uma certa e determinada quantia.
Tenho
tudo, amigos meus! não penseis que me iluda sobre a eficácia das providências
que possa a polícia tomar, a fim de salvar das pancadas o corpo e da devassidão
a alma de qualquer dessas meninas. Bem sei que, enquanto o mundo for mundo e
enquanto houver meninas — proteja-as ou não as proteja a polícia —, haverá pais
que as esbordoem, mães que as vendam, cadelas que as industriem ; cães que as
deflorem!
Bem o
sei: mas sei também que possuo nervos que vibram, coração que se impressiona e
olhos que veem. E se a polícia não pode impedir a continuação dessa infâmia —
pode pelo menos impedir que ela se ostente, escandalosa, florescendo e
frutificando à sombra da sua indulgência e da sua tolerância.
A
polícia não pode proibir também que as meretrizes de profissão se entreguem ao
seu comércio. Mas não deixa que elas apareçam nuas à janela, e muito menos
consente que venham fazer no meio da rua, à luz meridiana, o que fazem no
interior das casinhas de porta e janela. Com um milhão de raios! quem tem a desgraça
de possuir dentro do organismo um cancro incurável — não podendo extirpá-lo,
trata ao menos de o esconder, por higiene, por decência, por pudor!
Demais,
que custa abrir um inquérito para conseguir saber que grau de parentesco existe
entre as crianças vendedoras de flores e os que as exploram? Eu, por mim, posso
afirmar a quem de direito que, em cada grupo de dez crianças dessas,
interrogadas por mim, duas apenas me têm dito que conhecem pai ou mãe…
Enfim,
todos nós temos mais que fazer. E talvez a sorte melhor que se possa desejar
hoje em dia a uma criança pobre — seja uma boa morte, uma dessas generosas
mortes providenciais, que valem mais que todas as esmolas, todas as bênçãos,
todos os augúrios felizes e… toda a comiseração dos cronistas.
PROSTITUIÇÃO
INFANTIL - Crônica de Olavo Bilac- Gazeta de Notícias 14/8/1894
sexta-feira, 8 de março de 2013
domingo, 13 de janeiro de 2013
De Bertolt Brecht
Ao Camarada Dimitrov, quando lutou diante do Tribunal fascista em Leipzig *
Camarada Dimitrov!
Desde o dia em que lutastes diante do tribunal fascista
a voz do comunismo, cercada pelos bandos de matadores e bandidos da SA
através do ruído dos chicotes e cassetetes,
fala bem alto e nítido
no centro da Alemanha.
Voz que pode ser ouvida em todas as nações da Europa,
que através das fronteiras ouvem o que vem
do escuro, elas mesmas no escuro,
mas também pode ser ouvida
por todos os explorados e espancados e
incorrigíveis lutadores
na Alemanha.
Com avareza utilizas, camarada Dimitrov, cada minuto
que te é dado, e o pequeno lugar que
ainda é público, utiliza-o
para todos nós.
Mal dominando a língua que não é a tua
sempre advertido aos gritos,
várias vezes arrastado para fora,
enfraquecido com as algemas,
fazes repetidamente as perguntas temidas.
Incriminas os criminosos e
leva-os a gritar e te arrastar e assim
confessar que não têm razão, apenas força.
Embora não tão visíveis
milhares de combatentes, mesmo os
ensangüentados em suas celas
que podem ser abatidos
mas nunca vencidos.
Assim como tu, suspeitos de combater a fome,
acusados de revolta contra os exploradores,
incriminados por lutar contra a opressão,
convictos da causa mais justa.
Camarada Dimitrov!
Desde o dia em que lutastes diante do tribunal fascista
a voz do comunismo, cercada pelos bandos de matadores e bandidos da SA
através do ruído dos chicotes e cassetetes,
fala bem alto e nítido
no centro da Alemanha.
Voz que pode ser ouvida em todas as nações da Europa,
que através das fronteiras ouvem o que vem
do escuro, elas mesmas no escuro,
mas também pode ser ouvida
por todos os explorados e espancados e
incorrigíveis lutadores
na Alemanha.
Com avareza utilizas, camarada Dimitrov, cada minuto
que te é dado, e o pequeno lugar que
ainda é público, utiliza-o
para todos nós.
Mal dominando a língua que não é a tua
sempre advertido aos gritos,
várias vezes arrastado para fora,
enfraquecido com as algemas,
fazes repetidamente as perguntas temidas.
Incriminas os criminosos e
leva-os a gritar e te arrastar e assim
confessar que não têm razão, apenas força.
Embora não tão visíveis
milhares de combatentes, mesmo os
ensangüentados em suas celas
que podem ser abatidos
mas nunca vencidos.
Assim como tu, suspeitos de combater a fome,
acusados de revolta contra os exploradores,
incriminados por lutar contra a opressão,
convictos da causa mais justa.
* George Dimitrov, revolucionário búlgaro e dirigente da Internacional Comunista, foi acusado pelos nazistas de incendiar o parlamento alemão (Reichstag) em janeiro de 1933. Assumindo a própria defesa, Dimitrov desmascarou, no julgamento do processo, a farsa montada pelos nazistas para criminalizar os comunistas e desencadear feroz repressão contra as massas populares na Alemanha. Usando uma lógica precisa e implacável, Dimitrov derrubou um a um os argumentos da acusação, provando a todos sua inocência. Esta é considerada a 1º derrota significativa dos nazistas, prenuncio de sua queda final que viria em 1945.
Camarada Wlassowa
Esta é a nossa camarada Wlassowa, boa lutadora,
dedicada, astuta e firme.
Firme na luta, astuta contra nossos inimigos e dedicada
na agitação. Seu trabalho é miúdo,
tenaz e imprescindível.
Esta é a nossa camarada Wlassowa, boa lutadora,
dedicada, astuta e firme.
Firme na luta, astuta contra nossos inimigos e dedicada
na agitação. Seu trabalho é miúdo,
tenaz e imprescindível.
Onde quer que lute não está só.
Como ela lutam tenazes, firmes e astutas
em Twer, Glasgow, Lyon e Chicago,
Changai e Calcutá.
Todas as Wlassowas, de todo o mundo, boas formigas,
soldados invisíveis da revolução.
Imprescindíveis.
Como ela lutam tenazes, firmes e astutas
em Twer, Glasgow, Lyon e Chicago,
Changai e Calcutá.
Todas as Wlassowas, de todo o mundo, boas formigas,
soldados invisíveis da revolução.
Imprescindíveis.
Canção do Remendo e do Casaco
Sempre que o nosso casaco se rasga
vocês vêm correndo dizer: assim não pode ser;
isso vai acabar, custe o que custar!
Cheios de fé vão aos senhores
enquanto nós, cheios de frio, aguardamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
nos mostram o que por nós conquistam:
Um pequeno remendo.
Ótimo, eis o remendo.
Mas onde está
o nosso casaco?
Sempre que nós gritamos de fome
vocês vêm correndo dizer: Isso não vai continuar,
é preciso ajudá-los, custe o que custar!
E cheios de ardor vão aos senhores
enquanto nós, com ardor no estômago, esperamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
exibem a grande conquista:
um pedacinho de pão.
Que bom, este é o pedaço de pão,
mas onde está
o pão?
Não precisamos só do remendo,
precisamos o casaco inteiro.
Não precisamos de pedaços de pão,
precisamos de pão verdadeiro.
Não precisamos só do emprego,
toda a fábrica precisamos.
E mais o carvão.
E mais as minas.
O povo no poder.
É disso que precisamos.
Que tem vocês
a nos dar?
vocês vêm correndo dizer: assim não pode ser;
isso vai acabar, custe o que custar!
Cheios de fé vão aos senhores
enquanto nós, cheios de frio, aguardamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
nos mostram o que por nós conquistam:
Um pequeno remendo.
Ótimo, eis o remendo.
Mas onde está
o nosso casaco?
Sempre que nós gritamos de fome
vocês vêm correndo dizer: Isso não vai continuar,
é preciso ajudá-los, custe o que custar!
E cheios de ardor vão aos senhores
enquanto nós, com ardor no estômago, esperamos.
E ao voltar, sempre triunfantes,
exibem a grande conquista:
um pedacinho de pão.
Que bom, este é o pedaço de pão,
mas onde está
o pão?
Não precisamos só do remendo,
precisamos o casaco inteiro.
Não precisamos de pedaços de pão,
precisamos de pão verdadeiro.
Não precisamos só do emprego,
toda a fábrica precisamos.
E mais o carvão.
E mais as minas.
O povo no poder.
É disso que precisamos.
Que tem vocês
a nos dar?
Canção
Eles tem códigos e decretos.
Eles tem prisões e fortalezas.
(sem contar seus reformatórios!)
Eles tem carcereiros e juizes
que fazem o que mandam por trinta dinheiros.
Sim, e para que?
Será que e;es pensam que nós, como eles,
seremos destruídos?
Seu fim será breve e eles hão de notar
que nada poderá ajudá-los.
Eles tem prisões e fortalezas.
(sem contar seus reformatórios!)
Eles tem carcereiros e juizes
que fazem o que mandam por trinta dinheiros.
Sim, e para que?
Será que e;es pensam que nós, como eles,
seremos destruídos?
Seu fim será breve e eles hão de notar
que nada poderá ajudá-los.
Eles tem jornais e impressoras
para nos combater e amordaçar.
(sem contar seus estadistas!)
Eles tem professores e sacerdotes
que fazem o que mandam por trinta dinheiros.
Sim, e para que?
Será que precisam a verdade temer?
Seu fim será breve e eles hão de notar
que nada poderá ajudá-los.
para nos combater e amordaçar.
(sem contar seus estadistas!)
Eles tem professores e sacerdotes
que fazem o que mandam por trinta dinheiros.
Sim, e para que?
Será que precisam a verdade temer?
Seu fim será breve e eles hão de notar
que nada poderá ajudá-los.
Eles tem tanques e canhões,
granadas e metralhadoras
(sem contar seus cassetetes!)
Eles tem policia e soldados,
que por pouco dinheiro estão prontos a tudo.
Sim, e para que?
Terão inimigos tão fortes?
Eles pensam que podem parar,
a sua queda, na queda, impedir.
Um dia, e será para breve
verão que anda poderá ajudá-los.
E de novo bem alto gritarão: Parem!
Pois nem dinheiro nem canhões
poderão mais salvá-los.
granadas e metralhadoras
(sem contar seus cassetetes!)
Eles tem policia e soldados,
que por pouco dinheiro estão prontos a tudo.
Sim, e para que?
Terão inimigos tão fortes?
Eles pensam que podem parar,
a sua queda, na queda, impedir.
Um dia, e será para breve
verão que anda poderá ajudá-los.
E de novo bem alto gritarão: Parem!
Pois nem dinheiro nem canhões
poderão mais salvá-los.
Algumas perguntas a um "homem bom"
Bom, mas para que?
Sim, não és venal, mas o ralo
que sobre a casa sai também
Não é venal.
Nunca renegas o que disseste.
Mas, o que disseste?
És de boa fé, dás a tua opinião.
Que opinião?
Sim, não és venal, mas o ralo
que sobre a casa sai também
Não é venal.
Nunca renegas o que disseste.
Mas, o que disseste?
És de boa fé, dás a tua opinião.
Que opinião?
Toma coragem
contra quem?
És cheio de sabedoria
Pra quem?
Não olhas aos teus interesses.
Aos de quem olhas?
És um bom amigo.
Sê-lo-ás do bom povo?
contra quem?
És cheio de sabedoria
Pra quem?
Não olhas aos teus interesses.
Aos de quem olhas?
És um bom amigo.
Sê-lo-ás do bom povo?
Escuta pois: nós sabemos
que és nosso inimigo. Por isso vamos
Encostar-te a paredão. Mas em consideração
dos teus méritos e das tuas boas qualidades
Escolhemos um bom paredão e vamos fuzilar-te com
Boas balas atiradas por bons fuzis e enterrar-te com
Uma boa pá debaixo de terra boa.
que és nosso inimigo. Por isso vamos
Encostar-te a paredão. Mas em consideração
dos teus méritos e das tuas boas qualidades
Escolhemos um bom paredão e vamos fuzilar-te com
Boas balas atiradas por bons fuzis e enterrar-te com
Uma boa pá debaixo de terra boa.
O Comboio De Serviço
1
1
Por ordem Expressa do Führer,
o comboio de luxo expressamente feito para o congresso
do Partido em Nuremberg
recebeu o nome simples de COMBOIO DE SERVIÇO.
Os que o tomam prestam com isso um serviço
ao povo alemão.
o comboio de luxo expressamente feito para o congresso
do Partido em Nuremberg
recebeu o nome simples de COMBOIO DE SERVIÇO.
Os que o tomam prestam com isso um serviço
ao povo alemão.
2
O comboio de serviço
é uma obra-prima da técnica ferroviária. Os passageiros
tem apartamentos privativos. Pelas largas janelas
vêem os camponeses alemães mourejar os campos.
Se por acaso transpirassem nesse momento
poderiam tomar banho
Em cabines cobertas de ladrilhos.
Um sutil sistema de luzes permite-lhes
Ler à noite, de pé, sentados ou deitados, os jornais
Com as grandes reportagens sobre os benefícios do regime
Os vários apartamentos
Comunicam entre si por linhas telefônicas
Tal como as mesas dos grandes dancing's cujos clientes
Podem pedir às mulheres das mesas vizinhas
O preço que cobram.
Sem sair da cama os passageiros também podem
Ligar o rádio, que transmite as grandes reportagens
Sobre os erros do regime. Jantam,
Se assim o desejarem, no respectivo apartamento, e fazem as
respectivas necessidades
Em privadas revestidas de mármore.
Cagam
na Alemanha.
é uma obra-prima da técnica ferroviária. Os passageiros
tem apartamentos privativos. Pelas largas janelas
vêem os camponeses alemães mourejar os campos.
Se por acaso transpirassem nesse momento
poderiam tomar banho
Em cabines cobertas de ladrilhos.
Um sutil sistema de luzes permite-lhes
Ler à noite, de pé, sentados ou deitados, os jornais
Com as grandes reportagens sobre os benefícios do regime
Os vários apartamentos
Comunicam entre si por linhas telefônicas
Tal como as mesas dos grandes dancing's cujos clientes
Podem pedir às mulheres das mesas vizinhas
O preço que cobram.
Sem sair da cama os passageiros também podem
Ligar o rádio, que transmite as grandes reportagens
Sobre os erros do regime. Jantam,
Se assim o desejarem, no respectivo apartamento, e fazem as
respectivas necessidades
Em privadas revestidas de mármore.
Cagam
na Alemanha.
Unicamente Por Causa Da Desordem Crescente
Unicamente por causa da desordem crescente
Nas nossas cidades com suas lutas de classes
Alguns de nós nestes anos decidimos
Não mais falar nos grandes portos, da neve nos telhados,
das muralhas,
Do perfume das maçãs maduras na despensa, nas impressões da carne,
Nas nossas cidades com suas lutas de classes
Alguns de nós nestes anos decidimos
Não mais falar nos grandes portos, da neve nos telhados,
das muralhas,
Do perfume das maçãs maduras na despensa, nas impressões da carne,
De tudo o que faz o homem redondo e humano, mas
Falar só da desordem
E portanto ser parciais, secos, enfronhados nos negócios
Da política, e no rádio e "indigno" vocabulário
De economia dialética,
Para que esta terrível pesada promiscuidade
Das quedas na neve (elas não são só frias, nos bem o sabemos),
Da exploração, da tentação da carne e da justiça de classes,
Não nos leve a aceitação deste mundo tão diverso
Nem ao prazer das contradições de uma vida tão sangrenta.
Vocês entendem.
Falar só da desordem
E portanto ser parciais, secos, enfronhados nos negócios
Da política, e no rádio e "indigno" vocabulário
De economia dialética,
Para que esta terrível pesada promiscuidade
Das quedas na neve (elas não são só frias, nos bem o sabemos),
Da exploração, da tentação da carne e da justiça de classes,
Não nos leve a aceitação deste mundo tão diverso
Nem ao prazer das contradições de uma vida tão sangrenta.
Vocês entendem.
Da Violência
Do rio que tudo arrasta se diz que é violento.
Mas ninguém diz violentas
As margens que o comprimem.
Mas ninguém diz violentas
As margens que o comprimem.
Monólogo De Uma Atriz Enquanto Se Maquila
Vou fazer o papel de uma bêbada
que vende os filhos
em Paris, nos tempos da Comuna.
Tenho apenas cinco réplicas.
que vende os filhos
em Paris, nos tempos da Comuna.
Tenho apenas cinco réplicas.
E preciso de me deslocar, de subir a rua.
Caminharei como gente livre,
gente que só o álcool
quis libertar e voltar-me-ei
para o público.
Analisei as minhas cinco réplicas como os documentos
que se lavam com ácido para descobrir sob os caracteres visíveis
outros possíveis caracteres. Pronunciarei cada réplica
com a melhor acusação
contra mim e contra todos os que me olham.
Caminharei como gente livre,
gente que só o álcool
quis libertar e voltar-me-ei
para o público.
Analisei as minhas cinco réplicas como os documentos
que se lavam com ácido para descobrir sob os caracteres visíveis
outros possíveis caracteres. Pronunciarei cada réplica
com a melhor acusação
contra mim e contra todos os que me olham.
Se eu não refletisse, maquilar-me-ia simplesmente
como uma velha beberrona
doente e decadente. Mas vou entrar em cena
como uma bela mulher que guarda a marca da distribuição
na pálida pele outrora macia e agora cheia de rugas
outrora atraente e agora repelida
pra que ao vê-la cada um se interrogue: quem
fez isto?
como uma velha beberrona
doente e decadente. Mas vou entrar em cena
como uma bela mulher que guarda a marca da distribuição
na pálida pele outrora macia e agora cheia de rugas
outrora atraente e agora repelida
pra que ao vê-la cada um se interrogue: quem
fez isto?
Quem é teu inimigo?
O que tem fome e te rouba
o último pedaço de pão chama-o teu inimigo.
Mas não saltas ao pescoço
de teu ladrão que nunca teve fome.
o último pedaço de pão chama-o teu inimigo.
Mas não saltas ao pescoço
de teu ladrão que nunca teve fome.
Elogio Da Dialética
A injustiça avança hoje a passo firme.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
O poder apregoa: as coisas
continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam.
E em todos os mercados proclama a exploração:
Isto é apenas o meu começo.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
O poder apregoa: as coisas
continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam.
E em todos os mercados proclama a exploração:
Isto é apenas o meu começo.
Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem:
Aquilo que nós queremos nunca mais o alcançaremos.
Quem ainda está vivo nunca diga: nunca.
O que é seguro não é seguro.
As coisas não continuarão a ser como são.
Depois de falarem os dominantes, falarão os dominados.
Quem pois ousa dizer: nunca?
De quem depende que a opressão prossiga? De nós.
De quem depende que ela acabe? De nós.
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe e o que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã.
E nunca será: ainda hoje.
Aquilo que nós queremos nunca mais o alcançaremos.
Quem ainda está vivo nunca diga: nunca.
O que é seguro não é seguro.
As coisas não continuarão a ser como são.
Depois de falarem os dominantes, falarão os dominados.
Quem pois ousa dizer: nunca?
De quem depende que a opressão prossiga? De nós.
De quem depende que ela acabe? De nós.
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe e o que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã.
E nunca será: ainda hoje.
Elogio da terceira coisa
Sempre se ouve quão depressa
as mães perdem os filhos, mas eu
preservei o meu. Como o preservei? Através
da terceira coisa.
Eu e ele éramos dois, mas a terceira
coisa comum, a causa comum, foi ela
que nos uniu.
Eu mesma ouvi, às vezes,
conversas entre filhos e pais.
Mas como eram melhores as nossas conversas
sobre a terceira coisa, que nos era comum,
grande e comum para tantos homens!
Que perto nos encontrávamos, perto
dessa coisa: Que bom era para nós essa
boa coisa perto!
as mães perdem os filhos, mas eu
preservei o meu. Como o preservei? Através
da terceira coisa.
Eu e ele éramos dois, mas a terceira
coisa comum, a causa comum, foi ela
que nos uniu.
Eu mesma ouvi, às vezes,
conversas entre filhos e pais.
Mas como eram melhores as nossas conversas
sobre a terceira coisa, que nos era comum,
grande e comum para tantos homens!
Que perto nos encontrávamos, perto
dessa coisa: Que bom era para nós essa
boa coisa perto!
Elogio do Comunismo
Ele é razoável. Todos o compreendem. Ele é simples.
Você, por certo, não é nenhum explorador. Você pode entendê-lo.
Ele é bom para você. Informe-se sobre ele.
Os idiotas dizem-no idiota e os porcos dizem-no porco.
Ele é contra a sujeira e contra a estupidez.
Os exploradores dizem-no um crime,
mas nós sabemos
que ele é o fim dos crimes;
ele não é a loucura e sim
o fim da loucura.
Não é o caos e sim
uma nova ordem.
Ele é a simplicidade.
O difícil de fazer.
Você, por certo, não é nenhum explorador. Você pode entendê-lo.
Ele é bom para você. Informe-se sobre ele.
Os idiotas dizem-no idiota e os porcos dizem-no porco.
Ele é contra a sujeira e contra a estupidez.
Os exploradores dizem-no um crime,
mas nós sabemos
que ele é o fim dos crimes;
ele não é a loucura e sim
o fim da loucura.
Não é o caos e sim
uma nova ordem.
Ele é a simplicidade.
O difícil de fazer.
Elogio do Trabalho Clandestino
É bonito
usar da palavra na luta de classes.
Clamar alto e bom som pela luta das massas.
Pisar os opressores, libertar os oprimidos.
Árdua e útil é a pequena tarefa de cada dia
que secreta e tenaz tece
a rede do Partido sob
os fuzis apontados dos capitalistas.
Falar, mas
escondendo o orador.
Vencer, mas
escondendo o vencedor.
Morrer, mas
dissimulando a morte.
Pela glória quem não faria grandes coisas?
Mas quem as faz pelo olvido?
E a glória busca em vão
os autores do grande feito.
Sai da sombra por um momento
rostos anônimos, dissimulados,
e aceitai;
o nosso agradecimento.
usar da palavra na luta de classes.
Clamar alto e bom som pela luta das massas.
Pisar os opressores, libertar os oprimidos.
Árdua e útil é a pequena tarefa de cada dia
que secreta e tenaz tece
a rede do Partido sob
os fuzis apontados dos capitalistas.
Falar, mas
escondendo o orador.
Vencer, mas
escondendo o vencedor.
Morrer, mas
dissimulando a morte.
Pela glória quem não faria grandes coisas?
Mas quem as faz pelo olvido?
E a glória busca em vão
os autores do grande feito.
Sai da sombra por um momento
rostos anônimos, dissimulados,
e aceitai;
o nosso agradecimento.
Nada É Impossível De Mudar
Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito
como coisa natural.
Pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural.
Nada deve parecer impossível de mudar.
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito
como coisa natural.
Pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural.
Nada deve parecer impossível de mudar.
Nossos inimigos dizem
Nossos inimigos dizem: a luta terminou.
Mas nós dizemos: ela começou.
Mas nós dizemos: ela começou.
Nossos inimigos dizem: a verdade está liquidada.
Mas nós sabemos: nós a sabemos ainda.
Mas nós sabemos: nós a sabemos ainda.
Nossos inimigos dizem: mesmo que ainda se conheça a verdade
ela não pode mais ser divulgada.
Mas nós a divulgaremos.
ela não pode mais ser divulgada.
Mas nós a divulgaremos.
É a véspera da batalha.
É a preparação de nossos quadros.
É o estudo do plano de luta.
É o dia antes da queda de nossos inimigos.
É a preparação de nossos quadros.
É o estudo do plano de luta.
É o dia antes da queda de nossos inimigos.
O Analfabeto Político
O pior analfabeto
é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala,
nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo da vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político
é tão burro que se orgulha
e estufa o peito dizendo
que odeia a política.
Não sabe o imbecil que,
da sua ignorância política
nasce a prostituta, o menor abandonado
e o pior de todos os bandidos:
O político vigarista,
pilantra, corrupto e lacaio
das empresas nacionais e multinacionais.
é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala,
nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo da vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político
é tão burro que se orgulha
e estufa o peito dizendo
que odeia a política.
Não sabe o imbecil que,
da sua ignorância política
nasce a prostituta, o menor abandonado
e o pior de todos os bandidos:
O político vigarista,
pilantra, corrupto e lacaio
das empresas nacionais e multinacionais.
Os tecelões de Kujan-Bulak homenageiam Lênin
1
Com freqüência, e generosamente
homenageou-se o camarada Lênin. Existem bustos
e estátuas.
Cidades receberam seu nome, e também crianças.
Fazem-se conferências em muitas línguas
há reuniões e demonstrações
de Xangai a Chicago, em homenagem a Lênin.
Mas assim o homenagearam os tecelões de Kujan-Bulak,
pequena localidade no sul do Turquistão:
Com freqüência, e generosamente
homenageou-se o camarada Lênin. Existem bustos
e estátuas.
Cidades receberam seu nome, e também crianças.
Fazem-se conferências em muitas línguas
há reuniões e demonstrações
de Xangai a Chicago, em homenagem a Lênin.
Mas assim o homenagearam os tecelões de Kujan-Bulak,
pequena localidade no sul do Turquistão:
Lá, vinte tecelões deixam à noite,
tremendo de febre, seu tear miserável.
A febre está em toda a parte: a estação
é tomada pelo zumbido dos mosquitos, nuvem espessa
que se levanta do pântano atrás do velho cemitério de camelos.
Mas a locomotiva, que
a cada duas semanas traz água e fumaça, traz
um dia também a notícia:
Que está próximo o dia de reverenciar o camarada Lênin.
E a gente de Kujan-Bulak,
gente pobre, tecelões,
decide que também na sua localidade será erguido
um busto de gesso para o camarada Lênin.
Mas quando o dinheiro é coletado para o busto
encontram-se todos frementes de febre, a contar
seus copeques duramente ganhos com mãos sôfregas.
E o guarda vermelho Stepa Gamalew, que
conta com cuidado e observa com rigor,
vê a disposição de homenagear Lênin e se alegra,
mas também vê mãos inseguras.
E faz de repente a proposta
de com o dinheiro para o busto comprar petróleo
e derramá-lo no pântano trás do cemitério de camelos
de onde vêm os mosquitos
que produzem a febre.
De modo assim a combater a febre em Kujan-Bulak, e isto
em honra do falecido
mas não esquecido
camarada Lênin.
tremendo de febre, seu tear miserável.
A febre está em toda a parte: a estação
é tomada pelo zumbido dos mosquitos, nuvem espessa
que se levanta do pântano atrás do velho cemitério de camelos.
Mas a locomotiva, que
a cada duas semanas traz água e fumaça, traz
um dia também a notícia:
Que está próximo o dia de reverenciar o camarada Lênin.
E a gente de Kujan-Bulak,
gente pobre, tecelões,
decide que também na sua localidade será erguido
um busto de gesso para o camarada Lênin.
Mas quando o dinheiro é coletado para o busto
encontram-se todos frementes de febre, a contar
seus copeques duramente ganhos com mãos sôfregas.
E o guarda vermelho Stepa Gamalew, que
conta com cuidado e observa com rigor,
vê a disposição de homenagear Lênin e se alegra,
mas também vê mãos inseguras.
E faz de repente a proposta
de com o dinheiro para o busto comprar petróleo
e derramá-lo no pântano trás do cemitério de camelos
de onde vêm os mosquitos
que produzem a febre.
De modo assim a combater a febre em Kujan-Bulak, e isto
em honra do falecido
mas não esquecido
camarada Lênin.
Assim decidiram. No dia da homenagem conduziram
seus baldes amassados, cheios do petróleo negro
um atrás do outro
e regaram aquilo o pântano com aquilo.
Eles se ajudaram, ao homenagear Lênin
e o homenagearam, ao se ajudar, e o haviam, portanto,
compreendido.
seus baldes amassados, cheios do petróleo negro
um atrás do outro
e regaram aquilo o pântano com aquilo.
Eles se ajudaram, ao homenagear Lênin
e o homenagearam, ao se ajudar, e o haviam, portanto,
compreendido.
2
Ouvimos como a gente de Kujan-Bulak
homenageou Lênin. E quando, à noite
o petróleo havia sido comprado e derramado no pântano,
ergueu-se um homem na reunião, e solicitou
que fosse colocada uma placa na estação
com a narrativa do acontecimento, descrevendo
precisamente a mudança do plano e a troca
do busto de Lênin pelo tonel de petróleo destruidor da febre.
E tudo em homenagem a Lênin.
E também isto fizeram,
e colocaram a placa.
Ouvimos como a gente de Kujan-Bulak
homenageou Lênin. E quando, à noite
o petróleo havia sido comprado e derramado no pântano,
ergueu-se um homem na reunião, e solicitou
que fosse colocada uma placa na estação
com a narrativa do acontecimento, descrevendo
precisamente a mudança do plano e a troca
do busto de Lênin pelo tonel de petróleo destruidor da febre.
E tudo em homenagem a Lênin.
E também isto fizeram,
e colocaram a placa.
Perguntas De Um Trabalhador Que Lê
Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedras?
E a Babilônia várias vezes destruída -
quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas
da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
triunfaram os Césares? A decantada Bizâncio
tinha somente palácios para seus habitantes? Mesmo na lendária Atlântida,
os que se afogavam gritavam por seus escravos
na noite em que o mar a tragou.
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedras?
E a Babilônia várias vezes destruída -
quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas
da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
triunfaram os Césares? A decantada Bizâncio
tinha somente palácios para seus habitantes? Mesmo na lendária Atlântida,
os que se afogavam gritavam por seus escravos
na noite em que o mar a tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou quando sua Armada
naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou quando sua Armada
naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?
Cada página uma vitória.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.
Disponível no site: http://mepr.org.br/cultura-popular/poesias/96-coletanea-de-poemas-de-bertolt-brecht.html
Acessado no dia 13 de janeiro de 2013.
sexta-feira, 13 de julho de 2012
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